A Lei da Liberdade Econômica | por Izabela Vorcaro

LIBERDADE ECONÔMICA – LEI Nº 13.874/2019

 

Uma análise sob a perspectiva da atividade econômica e os novos requisitos para aplicação de desconsideração da personalidade jurídica

 

No dia 30 de abril de 2019, o Presidente da República, Jair Bolsonaro, publicou a Medida Provisória nº 881, denominada “MP da Liberdade Econômica”. O ato do Poder Executivo instituiu a Declaração de Direitos de Liberdade Econômica, estabeleceu as garantias de livre mercado, procedeu com a análise de impacto regulatório, dando, ademais, outras providências. Após passar pela aprovação do Congresso Nacional e do Senado Federal, a MP foi sancionada pelo Presidente e transformada na Lei Federal nº 13.874, de 20 de setembro de 2019.

Pontua-se, inicialmente, que a Liberdade Econômica, entoada há mais de 300 (trezentos) anos pela classe comerciante europeia, propõe um regime de intervenção estatal mínima na economia. Cabe-nos lembrar dos conceitos da “mão invisível” de Adam Smith[1] e da máxima do liberalismo clássico “laissez-faire(“deixe fazer”), segundo os quais o mercado se autorregularia, sendo, neste diapasão, desnecessária qualquer intervenção estatal.

Estes são, claramente, os objetivos da nova Lei.

O primeiro ponto a ser destacado é a “Declaração de Direitos de Liberdade Econômica”, cujo objetivo é o reconhecimento de direitos e garantias fundamentais, pensados como prerrogativas de defesa do cidadão contra o arbítrio do Estado. De início, percebe-se que a Lei pretende retomar normas gerais e principiológicas de ordem econômica, que, apesar de insculpidas na Constituição Federal de 1988, como por exemplo a disposta no artigo 170[2], não vinham sendo adotadas.

Veja-se os termos do artigo 1º, da Legislação, cujos termos refletem, efetivamente, a ideia de intervenção mínima do Estado, na economia:

Art. 1º.  Fica instituída a Declaração de Direitos de Liberdade Econômica, que estabelece normas de proteção à livre iniciativa e ao livre exercício de atividade econômica e disposições sobre a atuação do Estado como agente normativo e regulador, nos termos do disposto no inciso IV do caput do art. 1º, no parágrafo único do art. 170 e no caput do art. 174 da Constituição.

O segundo ponto a ser destacado são as áreas de abrangência da Norma. Menciona-se, neste aspecto, os termos do §1º, do artigo 1º:

1º. O disposto nesta Lei será observado na aplicação e na interpretação de direito civil, empresarial, econômico, urbanístico e do trabalho nas relações jurídicas que se encontrem no seu âmbito de aplicação, e na ordenação pública sobre o exercício das profissões, juntas comerciais, produção e consumo e proteção ao meio ambiente.

Pode-se dizer que a “MP”, atualmente transpassada à qualidade de Lei Federal, representa uma revolução no ambiente de negócios do país. Isto porque, as suas disposições garantem maior liberdade para empreender e pactuar, retomando a máxima segundo a qual “o contrato faz lei entre as partes” e o princípio “pacta sunt servanda”. Isso aparecerá de modo ainda mais acentuado na nova redação do artigo 421, caput e parágrafo único, do Código Civil/2002. Veja-se:

Art. 421.  A liberdade de contratar será exercida em razão e nos limites da função social do contrato, observado o disposto na Declaração de Direitos de Liberdade Econômica.

Parágrafo único.  Nas relações contratuais privadas, prevalecerá o princípio da intervenção mínima do Estado, por qualquer dos seus poderes, e a revisão contratual determinada de forma externa às partes será excepcional.

Dentre algumas garantias trazidas pela Lei Federal nº 13.874/2019, estão a desburocratização para obtenção de licenças emitidas pela Administração Pública nas atividades privadas de baixo risco, e o estabelecimento de prazos para que o Órgão emita autorizações de liberação da atividade econômica.

Estipulou-se prazo para que haja pronunciamento sobre estes assuntos que, decorrido sem manifestação do Ente Público, presume autorização tácita.

Ressalte-se que os incisos I e II, do art. 3º, da Lei, estabelecem que caberá a ato do Poder Executivo Federal dispor sobre a classificação de atividades de baixo risco, na ausência de Legislação Estadual, Distrital ou Municipal específica, que ocorrerá por meio do Comitê para Gestão da Rede Nacional para a Simplificação do Registro e da Legalização de Empresas e Negócios (CGSIM).

Neste diapasão, destaca-se que, em 11 de julho de 2019, o Órgão supramencionado publicou a Resolução nº 51 que “versa sobre a definição de baixo risco para os fins da Medida Provisória nº 881, de 30 de abril de 2019”, classificando as atividades de baixo, médio e alto risco.

Importante destacar ainda que, caso observadas as normas de proteção ao meio ambiente, condominiais, de vizinhança e Leis Trabalhistas, a atividade econômica poderá ser exercida em qualquer horário ou dia da semana (com exceção dos domingos – a regra continua valendo para este dia). Mudanças feitas pelo Congresso Nacional garantem esse funcionamento, inclusive em feriados, sem cobranças ou encargos adicionais.

Ressalte-se que o “batimento de ponto”, isto é, o controle de entrada e saída de funcionários, exigido em estabelecimentos empresariais com mais de 20 (vinte) trabalhadores, poderá ser feito por exceção, sendo obrigatório apenas para horas extras e dias não úteis, desde que acordado e previsto em Convenção Coletiva de Trabalho.

A Legislação também traz novidades ao compatibilizar a necessidade de simplificação do ambiente empresarial com o avanço da tecnologia. As pessoas físicas e jurídicas terão o direito de registrar e arquivar documentos por meio digital, cujos valores serão equiparados aos atos realizados de forma física.

A título de exemplo, menciona-se a possibilidade de registro automático de atos constitutivos, eventuais alterações e/ou extinções contratuais, independentemente de autorização governamental. A autenticação será feita em Cartório ou na Junta Comercial, por meio de comparação com o documento original, podendo, ressalte-se, ser dispensada por meio de declaração de autenticidade elaborada por advogado ou contador da Parte interessada.

Não há dúvidas de que as medidas propostas, e atualmente em vigor, fomentarão a atividade econômica do País, pelo que, indubitavelmente, ocorrerão efeitos na Ordem Jurídica de forma estável e permanente. Isto porque os termos da Lei, seguramente, representam um elástico passo para que a oitava economia mundial avance. Segundo pesquisa divulgada pelo site da “Uol”[3], o Brasil abriu 43.820 (quarenta e três mil oitocentos e vinte) vagas de emprego com carteira assinada em julho, e segundo a “Isto é Dinheiro”[4], a expectativa é que, com a vigência da Norma da Liberdade Econômica, sejam gerados cerca de 3.700.000 (três milhões e setecentos mil) empregos, em 10 (dez) anos.

Merecem destaque, ainda, os requisitos para a desconsideração da personalidade jurídica, que, certamente, irão afetar todo o setor de recuperação de crédito. Neste ponto, verifica-se claramente a intenção de definir os conceitos de “abuso de personalidade”, “desvio de finalidade” e “confusão patrimonial”, os quais, diga-se, já eram definidos e estabelecidos pela Doutrina e Jurisprudência.

A referido Instituto busca responsabilizar patrimonialmente as pessoas físicas que compõem uma determinada sociedade, pelas dívidas da pessoa jurídica. Essa imputação só ocorre em determinadas circunstâncias, quando demonstrada a ocorrência de desvio de finalidade, com intenção de blindagem patrimonial.

Trata-se de relevante ferramenta no âmbito da recuperação e satisfação de créditos, conferindo eficácia e celeridade para as demandas desta natureza. Porém, com as mudanças trazidas pela nova Lei, dificultou-se a comprovação, pelo credor, dos requisitos exigidos e necessários ao acolhimento deste tipo de pretensão.

Isto porque, propositalmente, antes da disciplina jurídica da desconsideração, o Legislador inseriu, no Código Civil, o art. 49-A, reafirmando a autonomia da pessoa jurídica em face da física, e, indiretamente o caráter excepcional do incidente. Veja-se:

Art. 49-A. A pessoa jurídica não se confunde com os seus sócios, associados, instituidores ou administradores.

Parágrafo único. A autonomia patrimonial das pessoas jurídicas é um instrumento lícito de alocação e segregação de riscos, estabelecido pela lei com a finalidade de estimular empreendimentos, para a geração de empregos, tributo, renda e inovação em benefício de todos.

Nesse sentido, temos a doutrina do jurista Flávio Tartuce[5]:

A regra é de que a responsabilidade dos sócios em relação às dívidas sociais seja sempre subsidiária, ou seja, primeiro exaure-se o patrimônio da pessoa jurídica para depois, e desde que o tipo societário adotado permita, os bens particulares dos sócios ou componentes da pessoa jurídica serem executados.

A nova redação do artigo 50 do CC/2002, que regula a desconsideração da personalidade jurídica, passou a dispor:

art. 50.  Em caso de abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade ou pela confusão patrimonial, pode o juiz, a requerimento da parte, ou do Ministério Público quando lhe couber intervir no processo, desconsiderá-la para que os efeitos de certas e determinadas relações de obrigações sejam estendidos aos bens particulares de administradores ou de sócios da pessoa jurídica beneficiados direta ou indiretamente pelo abuso.    (Redação dada pela Lei nº 13.874, de 2019).

1º  Para os fins do disposto neste artigo, desvio de finalidade é a utilização da pessoa jurídica com o propósito de lesar credores e para a prática de atos ilícitos de qualquer natureza.    (Incluído pela Lei nº 13.874, de 2019).

2º Entende-se por confusão patrimonial a ausência de separação de fato entre os patrimônios, caracterizada por:    (Incluído pela Lei nº 13.874, de 2019).

I – cumprimento repetitivo pela sociedade de obrigações do sócio ou do administrador ou vice-versa;    (Incluído pela Lei nº 13.874, de 2019).

II – transferência de ativos ou de passivos sem efetivas contraprestações, exceto os de valor proporcionalmente insignificante; e   (Incluído pela Lei nº 13.874, de 2019).

III – outros atos de descumprimento da autonomia patrimonial.   (Incluído pela Lei nº 13.874, de 2019).

3º  O disposto no caput e nos §§ 1º e 2º deste artigo também se aplica à extensão das obrigações de sócios ou de administradores à pessoa jurídica.   (Incluído pela Lei nº 13.874, de 2019).

4º  A mera existência de grupo econômico sem a presença dos requisitos de que trata o caput deste artigo não autoriza a desconsideração da personalidade da pessoa jurídica.   (Incluído pela Lei nº 13.874, de 2019).

5º  Não constitui desvio de finalidade a mera expansão ou a alteração da finalidade original da atividade econômica específica da pessoa jurídica.   (Incluído pela Lei nº 13.874, de 2019).

Em sua primeira redação, utilizava-se o termo “doloso” no § 1º. O dolo é a vontade livre e consciente de praticar determinada conduta ilícita, ou seja, a intenção de praticar determinado ato. Guilherme de Souza Nucci[6] define o dolo como sendo “a vontade consciente de realizar a conduta típica”. O Presidente Jair Bolsonaro, entretanto, ao sancionar a MP, convertendo-a em Lei, retirou a expressão do dispositivo.

Conforme dito pelo Professor Fábio Konder Comparato[7], a “desconsideração da personalidade jurídica é operada como consequência de um desvio de função, ou disfunção, resultando, sem dúvida, as mais das vezes, de abuso ou fraude, mas que nem sempre constitui um ato ilícito”.

Se mantida a palavra “dolo” no Dispositivo Legal, criar-se-ia um cenário totalmente desfavorável aos credores, que ficariam incumbidos do ônus de uma prova muito difícil de se produzir, a saber, demonstrar, documentalmente, a intenção de blindagem patrimonial e o desvio da personalidade jurídica. Seriam grandes os entraves para a incidência da desconsideração da personalidade jurídica. Neste ponto, a retirada da palavra, há de ser reconhecida e parabenizada.

Ainda, na nova redação trazida pela Lei Federal nº 13.874/2019, tem-se que a confusão patrimonial como a ausência de separação de fato entre os patrimônios, caracterizada pelo (i) cumprimento repetitivo pela sociedade de obrigações do sócio ou do administrador ou vice-versa, (ii) transferência de ativos ou de passivos sem efetivas contraprestações, exceto o de valor proporcionalmente insignificante, e (iii) outros atos de descumprimento da autonomia patrimonial.

Se a intenção era colocar fim à discricionariedade abusiva do Poder Judiciário, claramente, falhou-se nestes pontos, pois se abriu margem para a interpretação subjetiva de “obrigações repetitivas do sócio” e “valor proporcionalmente insignificante”. É notório que, por meio de um único ato isolado, é possível realizar um total esvaziamento patrimonial com o intuito de prejudicar credores. Assim, os dispositivos do artigo 50, dão abertura para se discutir e definir esses 03 (três) pontos, tornando-se ainda menos célere a marcha processual, em se tratando de pretensões que buscam desconsiderar a personalidade jurídica da Empresa.

Sobre o § 3º, do art. 50, conforme exposto por Flávio Tartuce[8], seria mais simples adaptar a redação do Dispositivo, nos termos do art. 133, § 2º, do Código de Processo Civil, que, ao tratar do incidente de desconsideração da personalidade jurídica, estabelece que “aplica-se o disposto neste Capítulo à hipótese de desconsideração inversa da personalidade jurídica”.

A redação que consta da Nova Lei, ao prever que “o disposto no caput e nos §§ 1º e 2º deste artigo também se aplica à extensão das obrigações de sócios ou de administradores à pessoa jurídica”, não é clara no sentido de que se trata de menção ao Instituto da desconsideração inversa

Neste diapasão, a Jurisprudência vem aceitando a desconsideração da autonomia patrimonial da pessoa jurídica, para buscar bens da sociedade empresária com fim de satisfazer dívidas contraídas pelos sócios. Veja-se:

AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. EMBARGOS À EXECUÇÃO. DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA. SOCIEDADE LIMITADA. PROVIDÊNCIA QUE ALCANÇA O PATRIMÔNIO DE TODOS OS SÓCIOS INDISTINTAMENTE. PRECEDENTES. REQUERIMENTO DA PARTE AGRAVADA DE APLICAÇÃO DA MULTA PREVISTA NO § 4º DO ART. 1.021 DO CPC/2015. INAPLICABILIDADE. AGRAVO IMPROVIDO. 1. O entendimento desta Corte é de que “para os efeitos da desconsideração da personalidade jurídica, não há fazer distinção entre os sócios da sociedade limitada. Sejam eles gerentes, administradores ou quotistas minoritários, todos serão alcançados pela referida desconsideração”. (REsp n. 1.250.582/MG, Relator Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado em 12/4/2016, DJe 31/5/2016). 2. A aplicação da multa prevista no § 4º do art. 1.021 do CPC/2015 não é automática, não se tratando de mera decorrência lógica do desprovimento do agravo interno em votação unânime. A condenação do agravante ao pagamento da aludida multa, a ser analisada em cada caso concreto, em decisão fundamentada, pressupõe que o agravo interno mostre-se manifestamente inadmissível ou que sua improcedência seja de tal forma evidente que a simples interposição do recurso possa ser tida, de plano, como abusiva ou protelatória, o que, contudo, não se verifica na hipótese examinada. 3. Agravo interno a que se nega provimento.(AgInt no REsp 1757106/SP, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, TERCEIRA TURMA, julgado em 02/09/2019, DJe 13/09/2019).

RECURSO ESPECIAL. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. AUSÊNCIA. EXECUÇÃO. RECONHECIMENTO DA EXISTÊNCIA DE GRUPO ECONÔMICO. DESCONSIDERAÇÃO INVERSA DA PERSONALIDADE JURÍDICA. EFEITOS DA DECISÃO. EMBARGOS À EXECUÇÃO OFERECIDOS POR EX-ACIONISTA. HONORÁRIOS DE SUCUMBÊNCIA. JUROS DE MORA. TERMO INICIAL. TAXA APLICÁVEL. JULGAMENTO: CPC/73. 1. Embargos à execução opostos em 19/06/2006, da qual foi extraído o presente recurso especial, interposto em 14/08/2015 e atribuído ao gabinete em 25/08/2016. 2. O propósito recursal é dizer sobre: (i) a negativa de prestação jurisdicional; (ii) os efeitos da desconsideração inversa da personalidade jurídica da recorrente para responder pelos honorários advocatícios de sucumbência arbitrados em embargos à execução oferecidos por sua ex-acionista; (iii) o excesso de execução, especificamente quanto ao termo inicial de incidência dos juros de mora e a taxa aplicável. 3. Devidamente analisadas e discutidas as questões de mérito, e suficientemente fundamentado o acórdão recorrido, de modo a esgotar a prestação jurisdicional, não há falar em violação do art. 535, II, do CPC/73. 4. No que tange à natureza jurídica dos embargos à execução, prevalece na doutrina e na jurisprudência o entendimento de que se trata de ação incidental de conhecimento, que dá origem a um processo autônomo, embora conexo ao processo de execução. 5. Essa interdependência entre as demandas – execução e embargos à execução – implica que os efeitos da decisão por meio da qual se reconhece a existência de um grupo econômico e se determina a desconsideração inversa da personalidade jurídica, enquanto medida voltada à maximização da responsabilidade patrimonial do devedor para a satisfação do credor, perduram até a extinção do processo de execução, vigorando, inclusive, nos embargos a ele oferecidos incidentalmente. 6. Hipótese em que, consubstanciada a unidade econômica entre a interessada e a recorrente, apta a incluir a segunda no polo passivo da execução movida contra a primeira, passam a ser ambas tratadas como uma só pessoa jurídica devedora, até a entrega ao credor da prestação consubstanciada no título executado. 7. O fato de a recorrente não ter participado, formalmente, dos embargos à execução oferecidos pela interessada, não tem o condão de afastar sua responsabilidade patrimonial, enquanto integrante do mesmo grupo econômico. 8. O entendimento das Turmas que compõem a Segunda Seção é no sentido de que o termo inicial dos juros moratórios, na cobrança de honorários de sucumbência, é a data em que o executado é intimado para pagamento na fase de cumprimento da sentença, caso a obrigação não seja adimplida de forma voluntária, bem como de que, nessa hipótese, devem ser calculados com base na taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e Custódia – SELIC. 9. Recurso especial conhecido e parcialmente provido. (REsp 1733403/SP, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 27/08/2019, DJe 29/08/2019).

AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. FRAUDE À EXECUÇÃO. OFENSA AOS ARTS. 458, 515 E 535 DO CPC/73. AUSÊNCIA DE OMISSÃO. PERSONALIDADE DA PESSOA JURÍDICA. DESCONSIDERAÇÃO INVERSA. POSSIBILIDADE. PRECEDENTES. SÚMULA Nº 83/STJ. FRAUDE E DESCONSIDERAÇÃO. REQUISITOS.

REEXAME DO ACERVO FÁTICO-PROBATÓRIO. SÚMULA Nº 7/STJ. DECISÃO MANTIDA. 1. Não há afronta aos arts. 458, 515 e 535 do CPC/73 quando o Tribunal de origem manifesta-se suficientemente sobre a questão controvertida, apenas adotando, de forma coerente, fundamento diverso daquele perquirido pela parte. 2. É admissível, em casos excepcionais, a desconsideração inversa da personalidade da pessoa jurídica. Súmula nº 83/STJ. 3. A pretensão de verificar se preenchidos os requisitos para a desconsideração da personalidade e se configurada a fraude à execução somente se processa mediante o reexame do conjunto probatório carreado aos autos, o que encontra óbice na Súmula nº 7/STJ. 4. Agravo interno não provido.(AgInt no REsp 1331399/PR, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 20/08/2019, DJe 23/08/2019).

Embora a nova Lei seja (muito) positiva em certos aspectos, merece também ressalvas, como as feitas em relação à nova abordagem do instituto da desconsideração da personalidade jurídica. Veja-se que, ao mesmo tempo em que se busca fomentar a economia, desburocratizando e otimizando sistemas organizacionais e operacionais da sociedade, e estimulando empreendedores de pequeno e médio porte, ainda protege grandes empresários frente a pequenos e médios credores.

Ou seja, há um descompasso na intenção, pois a dificuldade de se satisfazer eventual crédito, vai, com certeza, contra a maré aquecedora da economia. Cria-se, neste ponto, um desencorajamento nas relações comerciais, pois possivelmente subsistirá um clima de insegurança nas relações comerciais e empresariais, o que poderá enfraquecer a movimentação do mercado, e, possivelmente, influenciará de forma negativa nos procedimentos que buscam a recuperação de créditos frente a Empresas, e seus respectivos Sócios.

Destaca-se, por fim, a polêmica referente à data de entrada em vigor da Lei, considerando o veto do inciso I, do art. 20 da Lei 13.874/19, isto é, se teriam aplicabilidade imediata ou apenas após o período vacatio de 45 (quarenta e cinco) dias.

Entretanto, conforme exposto pelos juristas Flávio Tartuce[9] e Pablo Stolze Gagliano[10] , levando em consideração as razões para este veto[11], conclui-se, por óbvio, pela vigência imediata da Lei da Liberdade Econômica.

Izabela Vorcaro

(31) 3261-8083

[1] SMITH, Adam. “A riqueza das nações”, 9 de mar. 1776.

[2] art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios: I – soberania nacional; II – propriedade privada; III – função social da propriedade; IV – livre concorrência; V – defesa do consumidor; VI – defesa do meio ambiente, inclusive mediante tratamento diferenciado conforme o impacto ambiental dos produtos e serviços e de seus processos de elaboração e prestação;  VII – redução das desigualdades regionais e sociais; VIII – busca do pleno emprego; IX – tratamento favorecido para as empresas de pequeno porte constituídas sob as leis brasileiras e que tenham sua sede e administração no País. Parágrafo único. É assegurado a todos o livre exercício de qualquer atividade econômica, independentemente de autorização de órgãos públicos, salvo nos casos previstos em lei.

[3]  FERREIRRA, Afonso. “Brasil cria 43.820 vagas com carteira em julho, 4º mês seguido no azul”. Matéria Uol Economia São Paulo, em 23 de ago. de 2019. Disponível em: <https://economia.uol.com.br/empregos-e-arreiras/noticias/redacao/2019/08/23/caged.htm>. Acesso em: 25 de set. de 2019.

[4] AGÊNCIA  BRASIL. “ MP da Liberdade Econômica vai gerar 3,7 milhões de empregos em 10 anos”. Matéria Isto É Dinheiro, em 14 de ago. de 2019 “Disponível em: <https://www.istoedinheiro.com.br/mp-da-liberdade-economica-vai-gerar-37-milhoes-de-empregos-em-10-anos/  >. Acesso em: 25 de set. de 2019.

[5] TARTUCE, Flávio. Manual de Direito Civil. 7ª Ed. São Paulo: Gen, 2017, pág. 179.

[6] NUCCI, Guilherme de Souza, Manual de Direito Penal. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 7ª. Ed, 2011, pág. 233

[7] COMPARATO, Fábio Konder. O Poder de Controle na Sociedade Anônima. 3ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 1983, págs. 284-286.

[8] TARTUCE, Flávio. “A “lei da liberdade econômica” (lei 13.874/19) e os seus principais impactos para o Direito Civil. Primeira parte”. Matéria Migalhas, em 24 de set. de 2019. Disponível em: <https://www.migalhas.com.br/dePeso/16,MI311604,91041-A+lei+da+liberdade+economica+lei+1387419+e+os+seus+principais >. Acesso em: 25 de set. de 2019.

[9] TARTUCE, Flávio. “A “lei da liberdade econômica” (lei 13.874/19) e os seus principais impactos para o Direito Civil. Primeira parte”. Matéria Migalhas, em 24 de set. de 2019. Disponível em:https://www.migalhas.com.br/dePeso/16,MI311604,91041+lei+da+liberdade+economica+lei+1387419+e+os+seus+principais . Acesso em: 25 de set. de 2019.

[10] STOLZE GAGLIANO, Pablo. “A Lei n. 13.874 de 2019 (Liberdade Econômica): a Desconsideração da Personalidade Jurídica e a Vigência do Novo Diploma”. Artigo JusBrasil. Acessado em 25 de set. de 2019.

[11] “A propositura legislativa, ao estabelecer o prazo de noventa dias para a entrada em vigor dos arts. 6º ao 19 do projeto de lei, contraria o interesse público por prorrogar em demasia a vigência de normas que já estão surtindo efeitos práticos na modernização do registro público de empresas, simplificação dos procedimentos e adoção de soluções tecnológicas para a redução da complexidade, fragmentação e duplicidade de informações, entre outros. Nestes termos, deve prevalecer a norma do inciso II do art. 20, que estabelece a vigência imediata do projeto de lei, na data de sua publicação” Disponível em:<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2019-2022/2019/Msg/VEP/VEP-438.htm>. Acessado em 25 de set. de 2019.

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